O voto do ministro Alexandre Moraes contrário à tese do marco temporal foi um sopro de esperança para os povos indígenas no julgamento do Supremo Tribunal Federal (STF) desta quarta-feira (7/6), mas o novo adiamento da decisão final abre espaço para que a bancada ruralista do Senado acione os tratores para acelerar a tramitação do projeto de lei que trata do assunto.
Pela nova regra do Supremo, o autor do pedido de vistas – no caso, André Mendonça – tem 90 dias para emitir seu voto. Caso contrário, o processo volta à pauta automaticamente. Até agora, o placar está 2 a 1 em favor dos indígenas e contra o marco temporal. Ainda restam 7 votos.
Após a aprovação relâmpago na Câmara no último dia 30 de maio, o PL 490/2007 foi remetido para o Senado, onde se transformou no PL 2.903/2023. O texto foi encaminhado para análise da Comissão de Agricultura e Reforma Agrária (CRA), onde será relatado pela presidenta do colegiado, senadora Soraya Tronicke (União-MT).
Para o líder do PT no Senado, Fabiano Contarato (ES), no entanto, a CRA será apenas a primeira etapa dos debates da iniciativa na Casa. Ele propôs que o texto passe por mais duas comissões temáticas.
“O PL do Marco Temporal, aprovado de forma açodada na Câmara, representa um violento retrocesso. Esse projeto não pode tramitar no Senado como está. Por isso, protocolei um requerimento para que a Comissão de Direitos Humanos e Legislação Participativa [CDH] e a Comissão de Meio Ambiente [CMA] façam parte das discussões e sejam ouvidas durante o andamento do projeto”, anunciou nesta terça-feira (6).
Para o senador, a decisão dos deputados foi vergonhosa. “A Câmara optou por reforçar seu compromisso com o trágico e violento apagamento dos povos indígenas. A aprovação do Marco Temporal é o derradeiro gesto de crueldade colonialista que desferimos contra nosso próprio povo”, resumiu.
Além do ataque aos direitos indígenas ao restringir a demarcação de terras à ocupação dos povos originários na data da promulgação da Constituição (5/10/1988), a tese do marco temporal atende aos interesses econômicos de grandes conglomerados.
Disputas em SC
O caso em debate no Supremo é um recurso da Funai (Fundação Nacional dos Povos Indígenas) contra decisão do Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4) que deu razão ao estado de Santa Catarina na disputa com o povo Xokleng pela posse da Terra Indígena Ibirama.
A decisão tem a chamada “repercussão geral”, ou seja, servirá de parâmetro para a legitimidade de todas as mais de 700 demarcações de terras indígenas no país, beneficiando gigantes do agronegócio e ameaçando ainda mais o maio ambiente.
Exemplo disso é a outra ação envolvendo a mesma região catarinente. Caso a tese do marco temporal seja aprovada, a empresa Modo Battistella Reflorestamento (Mobasa) será diretamente beneficiada. Pertencente ao conglomerado da família Battistella, a empresa extratora de madeira pede que a Justiça anule a demarcação da Terra Indígena Ibirama La-klaño. A família também fabrica madeira serrada de pinheiro (pinus), é dona do Porto de Itapoá (SC), o terceiro maior do país em movimentação de contêineres, e dona da Cotrasa, uma das maiores revendedoras de caminhões Scania do país.