Projeto é vazio, porque lei proposta por Aécio Neves |
Mesmo sendo inócuo, posto que o Bolsa Família já se encontra protegido contra mudanças, projeto foi aprovado pela Comissão de Constituição e Justiça (CCJ). Além disso, sobrecarrega o já combalido orçamento de estados e municípios.
Apresentado em 30 de outubro último, com o costumeiro estardalhaço na grande mídia, o projeto do senador Aécio Neves (PSDB-MG), que pretende mudar a lógica do programa Bolsa Família, foi aprovado em tempo recorde (29 dias úteis) na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado, nesta quarta-feira (11), em votação simbólica.
Sua aprovação seguiu caminho já conhecido: a escolha de dois relatores colegas de bancada de Aécio: os tucanos Aloysio Nunes (SP) e Cássio Cunha Lima (PB).
Ambos assinam a aprovação do relatório que pretende alterar o Bolsa Família, reconhecido mundialmente pelas mudanças sociais que provocou no Brasil nos dez últimos anos. O PSDB quer alterar a essência do programa, com o argumento de que, uma vez integrado à Lei Orgânica de Assistência Social (LOAS), estará dando maiores garantias constitucionais à sua manutenção. Infelizmente, a afirmação é falsa.
O projeto não dá garantia extra alguma às regras já existentes – e por uma razão muito simples: a lei que instituiu o Bolsa Família, aprovada ainda no primeiro ano de mandato do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, já tem a proteção necessária contra medidas que ameacem sua integridade. Qualquer alteração no programa tem de ser obrigatoriamente aprovada pelo Congresso.
Pior do que tentar proteger o que já está assegurado é a fissura que o texto de Aécio Neves abre, criando fragilidades que hoje não existem. A mudança no funcionamento do programa proposta pelo tucano transfere parte da manutenção do Bolsa Família para as contas dos estados e municípios. Com essa alteração, Aécio Neves coloca o Bolsa Família na mesma fragilidade que hoje faz com que não sejam cumpridas leis importantes, como, por exemplo, o pagamento de salários dignos para professores. Ao ser incluído na LOAS, o Bolsa Família deverá ser custeado pelo orçamento da seguridade social de todos os entes da federação.
Transferir uma conta que hoje é centralizada pela União para os estados e municípios acarreta, também, em levar o Bolsa Família à mesma fragilidade em que se encontravam os programas sociais abertos nos últimos anos do governo FHC. Sem cadastro e sem controle, os programas encontravam-se desprotegidos contra fraudes, além de não exigir contrapartida dos beneficiários que pudesse ser efetivamente averiguada.
Estas observações fazem parte da Nota Técnica da Liderança do PT no Senado, que aponta a incoerência da iniciativa: o Bolsa Família já está previsto em lei e, sua eventual descontinuidade – “temor” do tucano -, deve ser precedida de decisão do Congresso Nacional. Ou seja, é necessária uma outra lei para mudar, ampliar ou acabar com o benefício. A simples inclusão do Bolsa Família na LOAS não é suficiente para aumentar ou diminuir o grau de proteção jurídica do programa.
O parecer ainda faz um alerta para o ônus orçamentário que o projeto de Aécio Neves irá acarretar aos estados, municípios e DF. Hoje, o programa é custeado pelo orçamento da União com a transferência dos recursos diretamente para os beneficiados e os gestores locais podem criar programas suplementares. Mas, da forma como está o projeto de lei o Bolsa Família passará a ser custeado pelo orçamento da seguridade social de todos os entes da federação, que serão obrigados a aderir à iniciativa. Por conseqüência, a medida levará ao aumento das contribuições sociais que financiam os programas LOAS.
Eleitoreira
Segundo Aécio, a ideia é “institucionalizar” o Bolsa Família, embora o programa já esteja garantido pela Lei 10.836/2004. “Não se institucionaliza um programa previsto em lei mencionando-o em um inciso de outra lei”, estranha o senador Humberto costa (PT-PE). Em recente pronunciamento no plenário, o senador petista alertou para os riscos de se alterar a lógica de uma iniciativa que vem dando certo exatamente porque seus benefícios são pagos diretamente aos beneficiários, sem intermediários, de quem são exigidas condicionantes, como a matrícula das crianças na escola e a caderneta de vacinação atualizada. Se o programa for incluído na LOAS, seus benefícios poderão ser pagos sem condicionantes.
Para Humberto, a proposta de Aécio é “eleitoreira. Ele diz agora que está preocupado com a transferência de renda, mas durante seu governo em Minas Gerais, em dois mandatos, não chegou a implantar nenhuma política pública para destinar dinheiro diretamente aos pobres”. O PLS 448/2013, porém, é uma mudança radical no tratamento dado pelo PSDB ao bem sucedido programa, inicialmente desqualificado como “bolsa esmola” e do qual posteriormente o partido tucano tentou reivindicar a paternidade.
Em outubro deste ano, o Bolsa Família celebrou seus primeiros 10 anos de existência, já tendo atendido 50 milhões de brasileiros, recebendo uma premiação mundial pelos resultados alcançados no combate à miséria. Na esteira das comemorações, Aécio apresentou o projeto aprovado nesta quarta-feira na CCJ. A matéria vai tramitar agora na Comissão de Assuntos Sociais do Senado.
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