Direitos Humanos

Brasil não pode mais negligenciar violências contra povos tradicionais, diz Paim

Violações das comunidades tradicionais e o desrespeito à Convenção 169 da OIT foram debatidas na CDH

Representantes de quilombolas e outros povos tradicionais acompanham a audiência pública

Brasil não pode mais negligenciar violências contra povos tradicionais, diz Paim

Violações aos direitos de povos tradicionais são discutidas na CDH do Senado. Foto: Agência Senado

A realidade enfrentada por milhares de comunidades e povos tradicionais foi tema de audiência da Comissão de Direitos Humanos (CDH) do Senado nesta quinta-feira (25/5). Os debatedores relataram as violações sofridas por essas comunidades, que vão desde o desrespeito aos seus territórios até o bloqueio de acesso a fontes de água potável.

“A Cáritas Brasileira é fundamental para a promoção da justiça social tão sonhada por todos nós. Seu principal objetivo é promover a caridade, a solidariedade, a pobreza, a desigualdade e a exclusão. A Cáritas é protagonista na construção de uma sociedade mais justa e solidária”, destaca o senador Paulo Paim (PT-RS), presidente da CDH.

O parlamentar também chamou a atenção para o fato de o Brasil ter violado de forma sistemática, nos últimos anos, a Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT) – principal instrumento jurídico internacional sobre a proteção dos direitos dos povos indígenas, quilombolas, ribeirinhos e demais povos e comunidades tradicionais.

“O Estado brasileiro não pode se omitir mais nem negligenciar esse cenário”, alerta Paulo Paim.

O diretor-executivo nacional da Cáritas Brasileira, Carlos Humberto Campos, lembrou que a Convenção 169 foi ratificada pelo Brasil – incorporada ao sistema jurídico nacional – fazendo com que o país tenha obrigações legais no reconhecimento e na proteção dos povos originários.

“É obrigação do governo brasileiro reconhecer e proteger os valores e práticas sociais, culturais, religiosas e espirituais próprias desses povos. E que seja garantida a realização da consulta livre, prévia e informativa. E esse direito está sendo negado. Isso causa muita dor e sofrimento nas comunidades”, destaca.

Relatos de violações cometidas

Representante da comunidade São Miguel do Rio Maracá, território quilombola do Igarapé do Lago do Maracá (AP), José Eldione Santos de Souza relatou que a pauta quilombola era proibida de ser tratada pelo Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) no governo anterior. Agora, no governo Lula, ele pediu “sensibilidade” dos poderes da República para garantir a titulação dos territórios.

“As violações que sofremos em nossos territórios não ocorrem apenas no Amapá ou em Sergipe. Ocorrem em todo o Brasil. Pedimos socorro ao Estado brasileiro. Somente com a regularização dos nossos territórios conseguiremos defender aquilo que é nosso”, destaca.

Maria Izaltina Silva Santos, representante da comunidade do Brejão dos Negros, localizada em Brejo Grande (SE), relatou parte da sua luta, de 17 anos, pelo reconhecimento do território onde reside.

“Estou aqui por um coletivo que tem sido massacrado pelo poder público que não apoia nossas comunidades e persegue nossas lideranças. Somos perseguidos por lutar por direitos humanos. Direitos humanos que são negados a todo momento para nosso povo”, disse.

Ela contou aos senadores que as terras quilombolas, principalmente da região litorânea, vêm sofrendo com o assédio de grupos econômicos com o intuito de explorar os terrenos, sem nenhum tipo de consulta às comunidades.

“Estamos no Brasil porque nossos ancestrais foram trazidos, nós não pedimos para vir. Mas, até hoje, nós não somos reconhecidos como brasileiros. Os únicos lugares que ficaram para ocuparmos, os esconderijos, nós ocupamos, mas hoje esses lugares estão sendo invadidos para implantação de empresas. É como se fossemos invisíveis para o poder público”, relata.

O senador Paulo Paim prometeu, ao fim da audiência, destinar recursos de emendas para que as comunidades tradicionais possam melhorar a infraestrutura existente. Além disso, se comprometeu a buscar representantes do governo Lula para a realização de um novo debate acerca da situação vivida pelos quilombolas no Brasil.

“Eu sou da base do governo, defendo esse governo. Mas tenho a obrigação de encaminhar as demandas do povo para o governo. E, lá, o governo delibera e busca o caminho para a solução. E, de pronto, digo que o governo Lula tem compromisso com todo o tipo de luta do povo brasileiro e o povo quilombola pode ter certeza de que com o governo Lula a história é outra”, enfatiza.

O trabalho da Cáritas Brasileira

A Cáritas Brasileira, fundada em 12 de novembro de 1956, é uma das 170 organizações-membro da Cáritas Internacional. Sua origem está na ação mobilizadora de dom Helder Câmara, então secretário-geral da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB).

As orientações do Concílio Vaticano II marcaram a ação da Cáritas, que, desde então, vive sob os valores da pastoralidade transformadora. A Cáritas é um organismo da CNBB e possui uma rede com 187 entidades-membro, 12 regionais e 5 articulações.

Desde a sua fundação, a Cáritas tem a prática de ouvir respeitosamente o sofrimento dos empobrecidos e dos que estão em situação de vulnerabilidade e favorecer ferramentas para transformar suas vidas.

“Entre os objetivos da Cáritas consta a promoção e a defesa da vida, de maneira especial, daqueles que são mais vulneráveis e, historicamente, as populações tradicionais”, disse Girolamo Domenico Treccani, professor da graduação e pós-graduação em direito da Universidade Federal do Pará (UFPA) e membro da Clínica de Direitos Humanos da Amazônia (CIDHA).

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