Alessandro Dantas

A Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado rejeitou integralmente, por unanimidade, nesta quarta-feira (24/9) a PEC da Blindagem (PEC 3/2021). Durante a discussão, os senadores do PT se manifestaram contra o texto aprovado anteriormente pela Câmara dos Deputados apontando os absurdos contidos na proposta.
O líder do governo no Senado, Rogério Carvalho (PT-SE), apontou a decisão dos senadores como uma rápida resposta no sentido de resgatar a moral dos parlamentares junto à sociedade.
“A gente viu, na semana passada, o sistemão dos privilégios se organizar, e mais de 300 parlamentares na Câmara dos Deputados votaram para manter e ampliar privilégios daqueles que querem impunemente cometer [crimes] ou caminhar na vida sem prestar contas para ninguém. Portanto, cabe todos nós refazermos esse curso e mostrar que o Senado da República tem compromisso com o povo e que não vai patrocinar a ampliação de privilégios que se confundem com o cometimento de crime e a impunidade”, afirmou Rogério.
A líder do PT no Senado, Augusta Brito (CE), afirmou que a votação desta quarta-feira mostra para a sociedade que o conjunto dos senadores estão atentos às demandas da população e não estão buscando aprovar nenhum tipo de legislação em benefício próprio.
“Que a gente possa derrubar na CCJ, hoje, essa PEC da Blindagem. Desde a semana passada a bancada do PT no Senado havia se manifestado, por unanimidade, de forma contrária a essa PEC”, explicou a líder.
Augusta ainda leu trecho da nota conjunta publicada pelos senadores do PT na qual os senadores anunciaram a posição contrária ao texto aprovado pela Câmara.
O senador Paulo Paim (PT-RS) afirmou que pela experiência de 40 anos como parlamentar tinha certeza de que a PEC da Blindagem seria rejeitada pela ampla maioria dos senadores. Além disso, com o recado dos milhões de brasileiros que foram às ruas no último domingo, uma série de deputados que votaram a favor do texto foram às redes sociais pedir perdão por seus votos.
“A PEC cria privilégios injustificáveis. Hoje, aqui na CCJ, a PEC da Blindagem irá para uma cova profunda. Não tem velório. Que ela seja enterrada definitivamente. Quando há o rufar dos tambores nas ruas e o grito do povo, muda o rumo da História. Vida longa à democracia”, declarou Paim.
Texto inconstitucional
O senador Fabiano Contarato (PT-ES) destacou que o texto aprovado pela Câmara dos Deputados afronta a Constituição ao violar o artigo 5º que afirma serem todos iguais perante a lei e o artigo 2º que traz de forma enfática que os poderes são independentes e harmônicos entre si.
“O que me faz diferente de um trabalhador, de um motorista de ônibus, de um pedreiro, de uma professora? Nós sabemos que, pela Constituição Federal, o parlamentar somente pode ser preso em flagrante de crime inafiançável. Eu fico imaginando um crime de corrupção praticado em concurso de pessoas entre um político e uma pessoa comum. A pessoa comum vai responder e vai ser condenada, e nós, aqui, no voto secreto, vamos enterrar aquela apuração”, apontou Contarato.
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Hipocrisia da extrema direita
O senador Humberto Costa (PT-PE) escancarou a hipocrisia dos parlamentares da extrema direita que foram eleitos defendendo, por exemplo, junto à sociedade o fim do foro privilegiado e levantando a bandeira do combate à corrupção. Mas bastou o Supremo Tribunal Federal avançar no julgamento daqueles que tentaram dar um golpe de Estado no Brasil que fizeram avançar a PEC da Blindagem cujos benefícios seriam estendidos, até mesmo, aos presidentes de partido.
“Se o parlamentar tivesse incorrido em crime de racismo, de tortura, de tráfico de drogas, de terrorismo e em crimes como ação de grupos armados civis ou militares, para que ele tivesse a aplicação daquela medida cautelar, seria necessário o voto secreto da maioria dos seus pares. E a extrema direita concordou e defendeu isso. Agora, não está com coragem de votar, mas defendeu isso, votou e comemorou. Até Pai Nosso rezaram lá na Câmara dos Deputados. Então, a máscara efetivamente caiu”, enfatizou Humberto.
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O líder do governo no Congresso, senador Randolfe Rodrigues (PT-AP) também apontou a hipocrisia dos parlamentares bolsonaristas que fizeram a proposta avançar na Câmara dos Deputados em meio às tratativas para fazer seguir adiante também o texto da anistia aos condenados pela tentativa de golpe de Estado.
“A posição dos colegas deputados é lamentável de todos os pontos de vista. Mas é importante dar os nomes devidos aos bois. Essa proposta foi parida de uma articulação em favor da tramitação também da proposta de anistia que o principal partido de oposição defendia na Câmara”, disse Randolfe.
Ele ainda criticou as iniciativas dos senadores Carlos Portinho (PL-RJ), Magno Malta (PL-ES) e Sergio Moro (União-PR) que apresentaram emendas numa tentativa de salvar a PEC da Blindagem e fazer avançar a iniciativa.
“Ontem surgiu proposta de emenda que relativizava, mantinha viva [a matéria]. Em outras palavras, criava uma blindagem ‘Nutella’ e não uma blindagem raiz”, criticou Randolfe.
Já a senadora Teresa Leitão (PT-PE) afirmou que, independentemente do mérito, a proposta já nasceu errada.
“Um processo de tanta abrangência não pode ser fruto de grupos que querem chantagear ou mostrar uma força momentânea de acordo com a conjuntura. Isso já desabona o processo e o mérito de qualquer ação”, alertou Teresa.
O que dizia a proposta aprovada pelos deputados
A PEC da Blindagem estabelecia que deputados e senadores só poderiam ser processados criminalmente se a Câmara ou o Senado autorizassem a abertura de ação penal no STF em até 90 dias após a apresentação da denúncia por qualquer tipo de crime.
Casos de prisão em flagrante por crimes inafiançáveis, como homicídio e estupro, também precisariam de autorização da Casa do parlamentar em até 24 horas, também por votação secreta.
A proposta ainda concederia foro especial para presidentes de partidos com assento no Congresso Nacional. Pelas regras atuais, apenas tem acesso ao foro por prerrogativa de função no STF o presidente da República, o vice-presidente, deputados, senadores, ministros de Estado, integrantes de tribunais superiores, do Tribunal de Contas da União (TCU) e embaixadores.