Seminário do PT

Combate à fome exige novo modelo agrário, dizem especialistas

Debatedores de seminário organizado pelo Partido dos Trabalhadores apontam a mudança do modelo de desenvolvimento da agricultura como essencial para que o país volte a superar a fome, como aconteceu nos governos Lula e Dilma
Combate à fome exige novo modelo agrário, dizem especialistas

Foto: Lula Marques

Especialistas afirmaram nesta terça-feira (15) que a adoção imediata de políticas públicas e a mudança no modelo de desenvolvimento da agricultura no país são os principais desafios para acabar com a fome que assola mais de 30 milhões de brasileiros e causa insegurança alimentar em quase metade da população. As declarações foram feitas durante o Seminário Resistência, Travessia e Esperança nos Territórios Rurais, organizado pelas bancadas do PT na Câmara e no Senado, a Fundação Perseu Abramo e a Secretaria Nacional Agrária do PT.

Ao abrir o evento, que é realizado de forma presencial e remota, o coordenador do Núcleo Agrário da Bancada do PT na Câmara, deputado Pedro Uczai (PT-SC), ressaltou que o debate foi organizado para tratar da realidade da agricultura brasileira, principalmente a familiar, e propor soluções ao problema da fome no país.

Para o líder do PT na Câmara, deputado Reginaldo Lopes (MG), o combate à fome é um dos temas mais importantes na agenda de reconstrução do país a partir de 2023. “O Brasil tem mais de 100 milhões de pessoas em situação de insegurança alimentar e outros 30 milhões que estão passando fome. Por isso, nosso olhar deve estar voltado para a implementação de políticas públicas e ações voltadas à agricultura familiar e ao combate fome”, defendeu.

Mudança da estrutura agrária 

O diretor-geral do Instituto Fome Zero, ex-diretor-geral da Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura (FAO) e ex-ministro de Segurança Alimentar e Combate à Fome no governo Lula, José Graziano, enfatizou que o combate à fome passa também pela questão agrária, cuja estrutura precisa ser modificada para assegurar alimentos a todos e todas.

Ele ressaltou que é necessário rediscutir o modelo de concentração de terras no país, que faz com uma minoria de 2% dos estabelecimentos rurais respondam por cerca de 70% da produção agropecuária nacional. “É uma concentração brutal da produção agropecuária”, observou.

Graziano destacou ainda que o desemprego, a informalidade e o baixo crescimento econômico contribuem para a volta da fome no Brasil. Para ele, a política de valorização do salário mínimo foi fundamental para tirar o país do Mapa da Fome, em 2014.

O ex-ministro também defendeu incentivos à agricultura familiar e observou que, enquanto grande parte da população passa fome ou está em situação de insegurança alimentar, o agronegócio exportador bate recordes em faturamento.

Dolarização

“Temos uma política monetária frouxa, que permite uma valorização excessiva dos preços das commodities devido à desvalorização do real. Enquanto isso, grande parte do valor dessas exportações sequer é internalizada no país e o povo sem salário ou com salários baixos perde poder de compra e não pode comprar uma cesta básica, que enfrenta sucessivas altas de preços”, afirmou Graziano.

Ele criticou o governo Bolsonaro pela falta de ação para tentar reverter a situação. “Hoje, o governo só tem um mecanismo para tentar enfrentar os preços altos (dos alimentos), que é baixar as taxas de importação desses produtos. Isso porque não tem estoque regulador e nem política de segurança alimentar e nem de incentivo à produção da agricultura familiar”, observou.

Direito à terra

O professor do Centro de Desenvolvimento Sustentável e do Programa de Pós-Graduação em Meio Ambiente e Desenvolvimento Rural (Mader) da UnB, Sérgio Sauer, também destacou que, para superar o problema da fome no país, é necessário democratizar o acesso à terra.

“A terra é um bem da natureza e não deveria ser encarada como um meio de acumulação de riqueza ou como um ativo financeiro. A terra tem que passar a ser vista como um lugar de vida, lugar de trabalho, lugar de produção de alimentos saudáveis e de identidade étnica-cultural. Essa nova definição é essencial para requalificar a função da terra e definir as políticas públicas que devem reger esse tema”, afirmou.

Governo omisso

Já a professora do Departamento de Nutrição da Universidade de Brasília (UnB) e integrante do Observatório de Políticas de Segurança Alimentar e Nutrição (Opsan), Elisabetta Recine, defendeu o fortalecimento de políticas públicas voltadas à segurança alimentar e à recomposição do Orçamento, reduzido desde o golpe de 2016.

Como exemplo da falta de compromisso do governo Bolsonaro, a docente citou a extinção do Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (Consea), órgão que coordenava as ações de combate à fome nos governos Lula e Dilma.

“O governo atual acabou com o Consea e desarticulou o Sisan (Sistema Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional), que integrava as políticas públicas do setor. Com isso, o governo praticamente acabou com todo o esforço feito ao longo de uma década (nos governos petistas), além de ter comprometido o orçamento das políticas públicas que restaram”, lamentou.

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