Desmonte da Saúde

Orçamento do SUS pode piorar em 2021

Se depender de Paulo Guedes e de Bolsonaro, SUS perderá recursos
Orçamento do SUS pode piorar em 2021

Foto: Arquivo EBC

O orçamento do Sistema Único de Saúde (SUS) para o ano que vem será decidido em agosto, quando, segundo prática de períodos anteriores, deve ir a voto na Câmara a Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) encaminhada pelo governo federal. Se depender de Paulo Guedes, ministro da Economia, e de seu chefe, o presidente da República, com a provável ajuda do chamado Centrão, o SUS vai ter ainda menos recursos em 2021. Especialistas do setor e parlamentares da oposição preparam-se para essa briga e tentam imaginar maneiras de conquistar a população para a tarefa de defender o sistema de saúde pública.

O governo quer manter em vigor no próximo ano as regras da emenda constitucional 95 e ainda retirar os créditos adicionais que foram aprovados recentemente pelo Congresso para enfrentar a atual pandemia. Se isso acontecer, em 2021 o orçamento voltará a exibir cifras parecidas às que teve em 2017, ano em que a EC 95 começou a valer, estabelecendo o congelamento por 20 anos das despesas em políticas públicas. As estimativas mais cautelosas apontam que isso vai retirar do orçamento do SUS R$ 35 bilhões, na comparação com o orçamento atual.

Se somadas as perdas acumuladas desde que a emenda constitucional passou a vigorar, o buraco no orçamento da saúde pública será ainda maior. Só em 2019, foram retirados R$ 22,5 bilhões do orçamento do SUS por causa da emenda 95.

Um Real a mais por dia
Na opinião de especialistas e de parlamentares, é preciso gerar uma mobilização urgente para impedir que mais retrocessos aconteçam. Propostas para evitar o desastre já estão na mesa. Em recente debate promovido pela tvPT, algumas ideias foram lançadas.

Combinação de dados orçamentários e estratégia de comunicação popular, uma dessas propostas é lançar uma campanha cujo tema seria “um real a mais por dia para o SUS”. O investimento atual do SUS é de R$ 3,60 por dia para cada brasileiro e brasileira. “Vamos divulgar essa informação e estabelecer uma meta de aumento desse investimento”, sugeriu o deputado federal Arlindo Chinaglia (PT-SP), que também é médico. “O sistema faz muito e com poucos recursos”, avalia Francisco Funcia, especialista em economia da saúde e do SUS, professor da Universidade Municipal de São Caetano. “Quando você pega um ônibus, gasta mais que isso com uma passagem”, diz Funcia.

O economista projeta o resultado desse aumento: “Se a gente fizesse uma campanha de R$ 1 a mais por dia, isso daria R$ 73 bilhões adicionais no sistema por ano. A gente sabe que o que o governo gasta em atenção básica é R$ 28 bilhões por ano. O programa Mais Médicos, inclusive com carreira única do estado para todos os trabalhadores, com todos os encargos trabalhistas, ficaria em R$ 7 bilhões o programa todo. R$ 1 a mais por dia daria 10 vezes o programa Mais Médicos”, imagina Funcia.

Incorporação dos créditos extras
Outra proposta emergencial de consenso foi apresentada: estabelecer um piso de investimento no SUS que incorpore para o próximo ano as verbas extras aprovadas no contexto da pandemia de Covid-19. A medida representaria algo em torno de R$ 30 bilhões a R$ 35 bilhões, segundo o economista Carlos Ocké, do Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada) e vice-presidente da Associação Brasileira de Economia da Saúde).

Esse aporte pode minimizar em parte as perdas acumuladas desde 2017. A incorporação desses créditos suplementares pode ajudar também a fazer frente aos desafios que se manterão em 2021. Ao contrário do que se possa imaginar, depois da pandemia as despesas do SUS não vão diminuir. Afinal, a população continuará aumentando, e o congelamento das verbas imposto pela emenda 95 não dá conta desse crescimento populacional.

Acrescente-se a isso o fato de que as perdas nos anos anteriores já comprimiram o orçamento. Calcule-se também que os procedimentos represados durante a pandemia – cirurgias eletivas, exames suplementares e de rotina adiados em função da crise sanitária, por exemplo – precisarão ser atendidos quando a pandemia arrefecer. Além disso, o uso intenso dos equipamentos do SUS durante a coronacrise vai certamente exigir manutenção e até mesmo substituição de aparelhos nos próximos meses.

Com a já conhecida falta de medicamentos, de equipamentos de proteção e de trabalhadores e trabalhadoras especializados em número suficiente, um orçamento igual ao de 2017 será trágico para o SUS e para os 75% da população brasileira que, segundo estatísticas oficiais, dependem integralmente do sistema para cuidar de sua saúde.

Dinheiro para o orçamento do SUS existe
Por isso, além da incorporação das verbas extras, outra proposta é que os R$ 22,5 bilhões que foram retirados do SUS em 2019 retornem ao orçamento no ano que vem.

No entanto, é previsível que o Ministério da Economia e os defensores da política de austeridade fiscal vão sacar o mesmo velho argumento que tem sido brandido ao longo de anos: não existe dinheiro, de onde vamos tirar recursos?

“Há uma farsa de que não há mais investimento no SUS porque o Brasil estaria quebrado. Não se trata disso: o país tem mais de R$ 1 trilhão na conta única do Tesouro. Só o lucro da equalização cambial das reservas deixadas pelos governos do PT já soma mais de R$ 500 milhões”, aponta o economista e sociólogo Bruno Moretti, assessor da bancada do PT no Senado.

O deputado Arlindo Chinaglia relembra algumas distorções do uso de recursos que afetam o Brasil e escondem dinheiro que existe, mas é usado para favorecer minorias já endinheiradas.

“No Brasil, as classes mais abastadas não pagam imposto quando recebem lucros e dividendos das empresas em que têm ações: isso daria R$ 50 bilhões a mais por ano. Temos uma sonegação de impostos por parte de empresas que soma pelo menos 500 bilhões por ano. Se a gente conseguisse que eles sonegassem apenas 80% disso, teríamos R$ 100 bilhões a mais por ano. Temos ainda as desonerações, nós somos a terra do Refis (Programa de Recuperação Fiscal). É um escândalo”, afirma o parlamentar.

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