(Foto: Alessandro Dantas)Rafael Noronha
A senadora Fátima Bezerra (PT-RN) presidiu, nesta segunda-feira (31), uma importante audiência pública que fará parte de ciclo de debates com intuito de debater a proposta de emenda à Constituição (PEC) 55/2016 – conhecida como PEC 241 quando tramitou na Câmara dos Deputados, que prevê o congelamento dos gastos públicos nos próximos 20 anos – e os seus impactos na sociedade brasileira. A primeira reunião debateu os efeitos da PEC da Desigualdade na educação do País.
Convidado a debater o tema, o governo ilegítimo de Michel Temer, por meio do Ministério da Educação, não enviou representante para explicar o ponto de vista dos atuais governantes e a justificativa para aprovar tal proposta, que modifica o texto constitucional.
“Repudio a atitude do Ministério da Educação, que nem veio e nem se dignou a mandar representante, nem justificou a ausência, ignorando o debate. Isso é uma atitude antipedagógica, de desrespeito”, lamentou Fátima Bezerra (PT-RN).
De acordo com a senadora, a PEC 55/2016 é “extremamente” nociva aos interesses da maioria da população. A proposta, além de limitar gastos nas áreas sociais, também anula pelas próximas duas décadas a vinculação constitucional que garante percentuais mínimos para áreas fundamentais como educação e saúde.
“A PEC 55 aliada a Medida Provisória que reformula o ensino médio e o projeto da escola sem partido são iniciativas que visam enterrar de vez a esperança de uma educação pública de qualidade, gratuita, laica, inclusiva”, lamentou a parlamentar.
Para a senadora Gleisi Hoffmann (PT-PR), presidente da Comissão de Assuntos Econômicos (CAE), apesar da complexidade que envolve a discussão do tema, a sociedade começou a se conscientizar do que significa a PEC para o desmonte, não só de programas construídos nos últimos anos, como também de garantias constitucionais nas áreas da educação, saúde, direitos fundamentais à vida da população.
Orlando Afonso Valle do Amaral, representante da Associação Nacional dos Dirigentes das Instituições Federais de Ensino Superior (Andifes), questionou o fato de a PEC 55 não conter nenhuma limitação de gastos nos recursos alocados para pagamento de juros, encargos e amortização da dívida. “Por que não escolher esse caminho? Limitar esses gastos. Não deixar de pagar a dívida, não dar calote, mas pagar da forma com que o País dá conta”, disse.
Segundo Orlando, a correção dos gastos com educação tendo como base a inflação do ano anterior significa, claramente, o congelamento de tais investimentos. “Se tivéssemos um país com a educação e a saúde muito bem estruturados, até poderia ser razoável a adoção dessa medida. Mas, num País injusto e desigual, com tantas carências na educação e na saúde, a adoção dessa fórmula significa condená-lo a ficar na situação atual, que não é nada boa”, disse.
O senador Lindbergh Farias (PT-RJ) alertou para a necessidade de a população se mobilizar contra a aprovação da PEC da Desigualdade. Segundo ele, essa é a única alternativa que resta e que pode mobilizar outros senadores a votarem contra a alteração constitucional.
Lindbergh ainda citou estudo do economista João Sicsu que, segundo ele, fez uma simulação de como seria o investimento, por parte do governo federal, na educação, caso a PEC tivesse sido aprovado em 2006. Atualmente, a União investe mais de R$ 100 bilhões. Com a PEC, esse investimento seria, hoje, de R$ 31 bilhões. Em saúde, ao invés de serem gastos R$ 102 bilhões anuais, o gasto, com a PEC, seria limitado a R$ 65 bilhões. “É um corte muito violento”, resumiu.
De 2006 a 2015, relatou o senador, os investimentos da União na área da educação subiram 130%. E, é exatamente esse investimento que a proposta do governo quer cortar com a mudança na Constituição de 1988. “Essa PEC desmonta completamente o precário estado social brasileiro. Tem duas formas de combater a desigualdade: uma pela arrecadação e outra com aumento de gastos sociais. É justamente aí que cai a PEC. Para destruir os avanços do último período”, disse.
Carlos Frederico Rocha, professor do Instituto de Economia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), afirmou que não há qualquer medida contida na PEC que exija uma mudança constitucional, com exceção da saúde e da educação. “É possível instituir tetos de gastos sem reforma constitucional. A PEC é, sim, feita para retirar direitos da saúde e da educação. Os direitos sociais que estão contidos na Constituição”, alertaram.
A estudante paranaense, Ana Júlia, que ganhou notoriedade e se tornou uma espécie de liderança das ocupações nas escolas de todo o Brasil após discursar sobre as ocupações nas escolas públicas do País na Assembleia Legislativa do Paraná enfatizou a importância do movimento para que os estudantes se façam ouvidos e possam opinar acerca dos rumos da educação do País.
“Esperamos que a Medida Provisória que muda o Ensino Médio não se concretize em lei e esperamos que [os governantes] aproveitem a oportunidade de levá-la aos profissionais de educação para que possa ser debatida e que a sociedade e os estudantes possam ser escutados”, disse. “Aqueles que votarem contra a educação estarão com as suas mãos sujas pelos próximos 20 anos”, emendou.
A senadora Regina Sousa (PT-PI) disse que jamais imaginou, depois de períodos turbulentos enfrentados pela política brasileira, ver a Constituição Federal de 1988 proibir o investimento na educação. De acordo com Regina, o instrumento mais adequado para realizar qualquer tipo de contenção de gastos, é o orçamento da União por meio de contingenciamentos. “Constitucionalizar despesas por 20 anos significa que o governante não está contando que vão nascer crianças nos próximos anos e elas precisarão de creches. Assim, o prefeito não vai construir creches para não extrapolar o teto de gastos. Não vai se construir, creches, escolas e nem universidades. Isso é muito grave”, enfatizou.
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