SEGURANÇA PÚBLICA

Só a polícia não resolve o problema da violência nas escolas

Em debate, especialistas apontam que é preciso fugir de ‘fórmulas mágicas’ e focar na criação de ambiente escolar seguro
Só a polícia não resolve o problema da violência nas escolas

Foto: Paulo Cezar/Ag. Pará

Não adianta colocar apenas policiais para resolver o problema da violência nas escolas e não focar, também, em outras medidas que criem um ambiente seguro. O tema foi tratado em audiência pública no Senado, nesta terça-feira (16), conduzida pelo líder do PT na Casa, Fabiano Contarato (PT-ES).

O encontro foi promovido pelas comissões de Assuntos Sociais (CAS), de Segurança Pública (CSP), de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ) e de Direitos Humanos e Legislação Participativa (CDH).

Para o atual secretário da área no Estado do Pará, Rossieli Soares, é preciso focar na formação de cidadãos valorizando a cultura da paz. “Estamos alimentando nossos indivíduos em uma sociedade cada vez mais preconceituosa, violenta. Não sei que cultura nós estamos produzindo, mas não é a de paz”, disse.

Ele afirma que é necessário que a segurança nas escolas seja um tema importante a ser tratado, mas não pode ser o único. “Não adianta nada colocar detector de metais nas escolas, policial, agente de portaria. Pode ajudar? Pode. Mas a solução não passa por aí”, argumentou.

“Porque o bandido, a hora que quiser fazer um ato, como aconteceu recentemente contra funcionários e estudantes, vai achar um jeito. Vai jogar por cima do muro, vai passar e não ter nada. Ou seja: nós precisamos olhar muito mais as causas que estão gerando essa onda no Brasil e no mundo”, acrescentou.

Nos estados, ao menos 102 projetos relacionados à segurança nas escolas foram apresentadas nas Assembleias Legislativas, de acordo com reportagem da Folha de S.Paulo. Entre as propostas, está a inclusão de detectores de metais, revistas de mochilas e atuação ativa do policiamento.

Tais medidas de segurança, no entanto, têm sido vendidas como ‘fórmula mágica’ para o problema no ambiente escolar, de acordo com a diretora-executiva do Instituto Sou da Paz, Carolina Ricardo.

“Isso tapa o sol com a peneira, pois dá uma sensação de tranquilidade para quem está com medo: ‘ah, vai ter policial na escola’. A gente até pode ter, mas não é só isso que vai solucionar. Passa a falsa sensação de segurança e acaba minando o debate mais profundo para a gente dar conta do problema”, colocou Carolina.

Nos Estados Unidos, por exemplo, há investimento alto em policiais armados nas escolas, segundo a diretora do Sou da Paz. No entanto, apenas casos pontuais de ataques são impedidos pela presença dos agentes de segurança.

“Nos Estados Unidos, o jornal The Guardian, inclusive, publicou um conjunto de matérias e compilações de dados sobre o tema. Não vai se resolver o problema da violência na escola colocando detector de metal, colocando policiamento na escola. Não é uma questão de achismo, é o que a literatura já nos colocou à disposição”, criticou o coordenador-geral de Políticas Educacionais para a Juventude do MEC, Yann Evanovick Leitão Furtado.

Segundo ele, é preciso cada vez tornar mais o tema num diálogo público, para que o ambiente acadêmico seja valorizado como instrumento de transformação social: “A escola ainda é o principal espaço de transformação de qualquer nação e estamos lutando muito para a rapidez necessária seguir transformando a educação brasileira”.

Em abril, o presidente Lula liberou R$ 3 bilhões em apoio estados e municípios para promoverem ações com o intuito de criar um ambiente escolar seguro. A ideia não é apenas investir em segurança, mas em formação, infraestrutura e equipamentos. O próprio presidente afirmou, na época, que a violência nas escolas não pode ser combatida apenas com muros mais altos e detectores de metal na porta das unidades de ensino.

Preconceito

Outro tema tratado pelos debatedores foi quanto ao preconceito. Para o senador Fabiano Contarato, agressões como racismo, sexismo, homofobia e intolerância religiosa acabam sendo reproduzidos no espaço acadêmico.

“Ainda vivemos num país sexista, em que se tenta se desqualificar uma pessoa, uma figura pública pelo fato de ser mulher. Tenta desqualificar pelo fato de ser preto. Ou por se ter a sua orientação sexual diferente do heteronormativo, assim como é grave o racismo religioso. Isso tem que nos inquietar. A gente não pode perder a capacidade de indignação”, afirmou o líder do PT no Senado.

O tema foi levantado no debate pela coordenadora-geral da Política para o Comunidades Tradicionais do Ministério da Igualdade Racial, Eloá Moraes. Ela argumentou que, no ambiente escolar, as mais diversas formas de preconceito acabam sendo reproduzidas pelos próprios alunos. Até mesmo contra professores.

“Na minha infância, lembro de ver outras liturgias e livros sagrados nas escolas. Principalmente a judaico-cristão. Isso não causa nenhum estranhamento para ninguém”, disse Eloá. “No entanto”, acrescentou, quando falamos sobre garantir o ensino de algo que está garantido na Lei, como é o caso da história da cultura africana, o professor sofre retaliação. Vai sofrer tanto de algumas famílias, pelo fundamentalismo religioso, quanto dos seus colegas”.

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