Neste 20 de novembro, Dia da Consciência Negra, a Comissão de Direitos Humanos (CDH) realizou audiência pública para debater os desafios para a construção de uma Constituição antidiscriminatória e antirracista. O senador Paulo Paim (PT-RS), presidente do colegiado, lembrou os avanços obtidos pela comunidade negra do Brasil ao longo dos anos, como a criação do Estatuto da Igualdade Racial e a política de cotas para ingresso no ensino superior, mas advertiu: ainda há muito o que fazer.
Outro exemplo citado pelo senador foi a aprovação da proposta, transformada em lei, que equipara o crime de injúria racial ao crime de racismo.
“Era um absurdo. Qualquer crime de racismo era [considerado como] injúria. E injúria [o criminoso] pagava com cesta básica, com retratação ou duas, três horas de serviço comunitário. Conseguimos aprovar aqui, no Congresso, que a injúria se tornaria crime de racismo, inafiançável e sem prescrição. E agora os crimes de racismo e injúria se complementam, são uma coisa só. É crime racial e fim de papo”, destacou o parlamentar.
“Nós fomos avançando ao longo do tempo. Fizemos muito, mas ainda temos muito por fazer”, completou Paulo Paim.
Combate ao racismo passa pela educação
Para o defensor público federal César de Oliveira Gomes, o caminho para a superação do racismo e da discriminação no país passa, inevitavelmente, pela educação.
“Qualquer discussão que caminhe no sentido de termos um sistema de Justiça que combata o racismo, e qualquer forma de discriminação, deve partir de uma pedagogia engajada e comprometida com o antirracismo. E isso começa, sobretudo, nos bancos acadêmicos”, disse.
A coordenadora da Associação Brasileira de Juristas pela Democracia (ABJD), Vera Lúcia Santana de Araújo, destaca não ser possível caracterizar o Brasil como uma nação constituída enquanto a maioria dos cidadãos continuam tendo acesso a direitos básicos negados cotidianamente.
“O Brasil está longe de se constituir uma nação. Nós temos um território, nós temos Estado, temos um povo. Mas não temos sequer unidade nacional. Não posso falar que há uma unidade nacional se eu pensar que o Estado vive precipuamente para negar direitos, fazer dos nossos territórios de hoje ainda um grande território de não direitos para a maioria da população brasileira”, lamentou.
Vera Lúcia Santana ainda fez alusão aos dados da pesquisa do Centro de Estudos de Segurança e Cidadania, que mostrou que, em 2022, das 4,2 mil pessoas mortas em ações policiais, 65% eram negras.
O professor da Faculdade de Direito da Universidade de Brasília (UnB) Douglas Pinheiro apontou que o desafio de um constitucionalismo antirracista passa por “permitir a existência de vidas negras nos espaços de direito e não apenas nos espaços de não direitos.”
A promotora de Justiça do estado da Bahia Lívia Sant’Anna Vaz lembrou que o Brasil é signatário da Convenção Interamericana contra o Racismo. Essa convenção tem força de norma constitucional, e determina aos países signatários que desenvolvam políticas públicas visando a diversidade racial na representação jurídico-política. Para Lívia, o Brasil vem descumprindo essa norma.
“Um de seus artigos obriga os países signatários que tenham diversidade étnico-racial em seus sistemas jurídico e político. O que vamos fazer para ter essa diversidade nos espaços jurídicos e políticos, que são os espaços transformadores?”, questionou.