O Brasil tem a obrigação de tratar as questões do racismo com maior severidade e responsabilidade. Essa foi a avaliação dos convidados para debater o racismo no futebol em audiência conjunta das Comissões de Direitos Humanos (CDH) e Esporte (CESP) do Senado.
“O futebol, como manifestação popular, tem o dever de ser exemplo. Afinal, o futebol é o esporte mais popular do Brasil. Aliado à educação, o esporte proporciona uma vida com mais consciência. A educação e o esporte libertam”, disse o senador Paulo Paim (PT-RS), presidente da CDH.
O diretor do Observatório da Discriminação Racial no Futebol, Marcelo Carvalho, relatou que o projeto foi criado, em 2014, para entender se os casos de racismo no futebol eram esporádicos ou recorrentes e compilar dados sobre o tema.
Em documento que será apresentado oficialmente apenas em outubro, Marcelo Carvalho disse que o Observatório registrou a ocorrência de 90 casos de racismo no futebol no ano passado. Marcelo aponta para a necessidade de avanço tanto na proteção dos atletas agredidos quanto na punição dos criminosos.
“Em 2023, nós temos a plena certeza de que os casos de racismo no futebol brasileiro acontecem com muita frequência. De 2014 para cá, continuamos presos no mesmo debate, e sem saber a quem punir. Assim, não avançamos”, lamenta.
O senador Paulo Paim classificou como vitória a aprovação da Lei Geral do Esporte (Lei 14.597/2023), sancionada em 15 de junho pelo presidente Lula, pelo texto legal trazer artigo específico para a criminalização do racismo no esporte.
“Existem relatos da prática desse crime por atletas, torcedores, dirigentes e arbitragem, diversos atores do futebol”, elenca Paim.
Campeonatos nacionais já têm punições previstas
O diretor de Desenvolvimento e Projetos da Confederação Brasileira de Futebol (CBF), Ricardo Leão, afirmou que a entidade foi a primeira do mundo do futebol a implementar sanções administrativas de combate ao racismo, entre as quais, a responsabilização dos clubes pela má conduta de seus torcedores, jogadores e gestores, com sanções administrativas que podem ir de advertência, portões fechados e multas até a perda de pontos.
“Todas essas condutas, a exemplo do que aconteceu na Espanha com Vinicius Junior, têm sido enfrentadas juntamente com órgãos como o Itamaraty e até mesmo a Interpol, para investigar, instaurar os processos e punir esses criminosos”, relata.
O ex-goleiro Aranha, alvo de atos racista durante uma partida do Santos, sua então equipe, contra o Grêmio, em 2014, relatou a dificuldade enfrentada pelos jogadores negros alvos de racismo, mesmo com o avanço da tecnologia e a ampliação das possibilidades para a identificação dos criminosos nas arenas esportivas.
“O racismo só não é um mal para aqueles que não querem abrir os olhos para todo o sofrimento que ele causa. Mesmo com todas as imagens, toda tecnologia envolvida no reconhecimento de atos racistas, ainda existem pessoas que negam a existência do racismo e fecham os olhos para todo o mal que o racismo causa”, diz.
Ações governamentais
O coordenador de Políticas Transversais da Diretoria de Combate ao Racismo do Ministério da Igualdade Racial, Paulo Victor Silva Pacheco, defendeu uma atuação mais intensiva das autoridades em defesa de direitos humanos, principalmente para que não se interrompam sonhos de jovens que se espelham em atletas como Vinicius Junior.
“Essa é a grande questão do governo federal, que retomou o plano Juventude Negra Viva, por exemplo, cujo objetivo é minimizar os efeitos da violência contra esse público. Formalizamos o grupo de trabalho interministerial, e o programa deve ser lançado em outubro, envolvendo todos os ministérios”, adianta.
Já o chefe da Assessoria de Participação Social e Diversidade do Ministério do Esporte, Dênis Rodrigues da Silva defendeu uma campanha permanente contra o racismo no esporte. Só assim, segundo ele, o número de casos começará a recuar.
“Combater o racismo nos esportes, de uma forma geral, não vai ser com apenas uma campanha. Não vai ser um único slogan que vai dar conta e o problema estará resolvido. É preciso estender isso ao longo do tempo. Vamos ter que trabalhar isso todos os anos e em todos os campeonatos”, aponta.