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Criminalização de porte e posse pode agravar problemas ligados às drogas, avaliam senadores

Proposta aprovada pela Comissão de Constituição e Justiça segue para análise do plenário. Senadores do PT alertam para riscos do texto em tramitação

Alessandro Dantas

Criminalização de porte e posse pode agravar problemas ligados às drogas, avaliam senadores

Senador Humberto Costa afirmou que proposta não ataca problemas relacionados ao consumo de drogas

A PEC das Drogas, em debate no Senado Federal, não deixa claro como fará a diferenciação entre usuário com pequena quantidade de drogas e o traficante, não enfrenta a questão relacionada à saúde pública dos dependentes químicos e pode servir para manter o encarceramento em massa de pretos e pobres que ficarão à disposição do crime organizado dentro das cadeias brasileiras.  

Esses foram alguns dos graves problemas apontados pelos senadores do PT na discussão realizada nesta quarta-feira (13/3) na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) acerca da Proposta de Emenda Constitucional (PEC 45/2023), de autoria do senador Rodrigo Pacheco (PSD-MG), e que criminaliza a posse e o porte de drogas ilícitas de qualquer tipo, em qualquer quantidade. 

A PEC foi apresentada pelo presidente do Senado em setembro do ano passado, como resposta à análise do Supremo Tribunal Federal (STF) sobre a descriminalização do porte da maconha para consumo pessoal. Ainda não há consenso na Corte sobre a quantidade que deve ser considerada para essa diferenciação entre traficante e usuário. 

O senador Efraim Filho (União-PB) apresentou o relatório com uma emenda que busca diferenciar usuário de traficante. E isso, de acordo com o senador Humberto Costa (PT-PE), pode agravar o problema de superlotação dos presídios brasileiros.  

“A proposta fala em diferenciar usuário de traficante, mas não explica como objetivamente fazê-lo. Ou essas pessoas são dependentes [químicos], ou não são. Se são dependentes, essas pessoas deveriam ter acesso ao tratamento”, alertou o senador. “Deveríamos estar preocupados em resolver esse problema de forma ampla, debatendo a situação social, econômica, o acesso à educação, a cultura e ao lazer. Essas coisas é que podem resolver a questão do enfrentamento às drogas”, emendou Humberto. 

Além de não resolver a questão de saúde pública, o senador Humberto Costa ainda alertou para a possibilidade de a mudança constitucional promover uma política de encarceramento em massa, principalmente de jovens pobres e pretos moradores de regiões de periferia. 

“Creio que o problema não se resolve [com a proposta] e, pelo contrário, teremos mais superlotação das cadeias com pessoas que não são traficantes. E na cadeia essas pessoas terão que se vincular a algum tipo de organização criminosa e virar soldados do crime organizado para sobreviver”, destacou o senador. 

A população negra encarcerada no sistema penitenciário brasileiro atingiu o maior patamar da série histórica do Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP), iniciado em 2005. De acordo com o anuário da entidade, divulgado em julho do ano passado, em 2022, havia 442.033 negros encarcerados no país, ou 68,2% do total das pessoas presas – o maior percentual já registrado. 

Quando a série histórica do FBSP começou, os negros representavam 58,4% das pessoas presas no país. Os brancos, no sistema prisional, eram 197.084 em 2022, ou 30,4% do total – bem abaixo do índice de 2005, quando eram 39,8% do sistema prisional. 

O senador Marcelo Castro (MDB-PI) também teceu duras críticas à proposta. Para ele, A PEC acaba equiparando o usuário ao traficante de drogas. 

“Nós estamos equiparando o usuário, o dependente, o doente, o recreativo, ao traficante, a um criminoso. Nós estamos colocando na Constituição que todo aquele que for pego com qualquer quantidade de droga, meio grama, ele é um criminoso. Isso é sensato? Isso é razoável? Eu entendo que não”, afirmou. 

Congresso volta atrás naquilo que já definiu 

O senador Fabiano Contarato (PT-ES) apontou que o Congresso Nacional já havia definido, em 2006, pela despenalização para quem adquirir, guardar, tiver em depósito, transportar ou trouxer consigo, para consumo pessoal, drogas sem autorização ou em desacordo com a legislação.  

Para esses casos, foram estabelecidas as penas de advertência sobre os efeitos das drogas, a prestação de serviços à comunidade e medida educativa de comparecimento a um programa ou curso educativo. 

Fabiano Contarato alertou para possibilidade da proposta ampliar quantidade de negros e pobres nas cadeias brasileiras

Além disso, o senador argumentou que promover mudança constitucional para criminalizar o porte e a posse de drogas não retira do Poder Judiciário a prerrogativa da apreciação sobre lesão ou ameaça a direito.  

“A lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito. Se nós nos acovardamos, nos intimidamos e não enfrentamos o tema para definir quem é traficante ou usuário, o STF é instado a dizê-lo. Aconteceu isso com o casamento entre pessoas do mesmo sexo, por exemplo”, destacou Contarato.   

Preocupação com o uso medicinal 

O líder do Governo no Senado, Jaques Wagner (PT-BA), mostrou preocupação com a possibilidade de o texto da proposta, da forma que foi apresentado, acabar punindo os pacientes que fazem uso medicinal do óleo de canabidiol ou as cooperativas que se organizam para produzir a substância.  

Jaques Wagner mostrou preocupação com possibilidade de criminalização do uso medicinal da maconha

“Temos pelo menos dez cooperativas que produzem o óleo para não ter que contrabandear de outros países, nos quais você compra esse produto em prateleiras de supermercado. Estou falando de um remédio feito a partir de um derivado da mesma planta. Nós precisamos dar uma luz para essas pessoas. Não podemos fechar os olhos para a ciência”, argumentou. 

Tramitação 

Aprovada na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), a PEC 45/2023 segue para a análise do plenário. No colegiado, o projeto teve votos contrários dos senadores Fabiano Contarato (PT-ES), Humberto Costa (PT-PE), Jaques Wagner (PT-BA) e Marcelo Castro (MDB-PI).  

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