A Comissão de Direitos Humanos (CDH) debateu, nesta terça-feira (15), a situação financeira dramática do ensino superior público brasileiro, em especial, os casos da Universidade Federal da Integração Latino-Americana (UNILA) e Universidade Federal da Integração Luso-Afro Brasileira (UNILAB), ambas fundadas durante a gestão do presidente Lula. Além delas, também houve a discussão acerca do orçamento destinado aos Institutos Federais espalhados por todo Brasil.
A Universidade Federal da Integração Latino-Americana (UNILA) começou a ser estruturada em 2007 – durante o governo do presidente Lula – em convênio com a Universidade Federal do Paraná (UFPR) e a Itaipu Binacional. Já a Universidade da Integração Internacional da Lusofonia Afro-Brasileira (Unilab) – também criada nas gestões Lula – começou a ser estruturada um ano mais tarde. Em parceria com outros países, principalmente africanos, a Unilab desenvolve formas de crescimento econômico, político e social entre os estudantes, formando cidadãos capazes de multiplicar o aprendizado.
Gustavo Oliveira Vieira, reitor da Universidade Federal da Integração Latino-Americana (UNILA), destacou que tanto ela quanto a Unilab propõem uma construção diversa dentro do sistema universitário brasileiro, pela expansão e ampliação de vagas a partir de diferentes referenciais, incluindo a diversidade.
“As universidades são jovens com projetos intelectuais maduros porque nos orientam uma outra perspectiva dentro do que chamamos de geopolítica do conhecimento. No caso da integração latino-americana, o que se fez até as últimas décadas era a busca por copiar o modelo de integração europeu. A Unila é criada com objetivo de ser um braço do processo de integração por uma política pública educacional. As duas [universidades] transcendem a perspectiva nacionalista. Nas nossas universidades, 50% são reservadas para não-brasileiros. A diversidade não é uma ameaça. É uma riqueza que nos constitui e a qual devemos buscar”, afirmou.
Vera Regina Rodrigues da Silva, professora do Curso de Antropologia da Universidade Federal da Integração Luso-Afro Brasileira (UNILAB) destacou os números da entidade. Pela universidade, segundo ela, já passaram estudantes de Cabo Verde, Guiné-Bissau, Angola, Moçambique, São Tomé e Príncipe e Timor Leste, que “assim como eu, muitos deles são a primeira geração a ingressar na escola pública”.
“É um universo de quase 5,2 mil estudantes e 597 servidores. Conheço o que significa o acesso à educação de ensino superior. Não conheço só por trajetória de vida por ser a primeira professora doutora em minha família e por ser a primeira geração de uma família negra que ingressa na universidade. Por querer ver outros professores e professoras doutoras e doutores que abracei o projeto da Unilab. É isso que nos move”, enfatizou.
Plínio Nogueira Maciel Filho, pró-reitor de planejamento da UNILAB, explicou que o Projeto de Lei Orçamentária Anual (PLOA) da entidade foi fechado no dia de ontem e basicamente replica o orçamento deste ano. “Estamos replicando o orçamento mesmo com o contingente de estudantes que estão chegando e a demanda aumentando. Hoje, essa é a característica que os reitores têm que colocar na sua bagagem e saber administrar com poucos recursos uma instituição. Como implantar uma instituição nova precisando de infraestrutura sem aporte [financeiro] suficiente para esse fim? ”, questionou.
O reitor explicou que, até o momento, a universidade passou por um contingenciamento de aproximadamente 25% de sua verba destinada ao custeio, 40% dos recursos de arrecadação própria e 70% destinados ao investimento.
Além da situação financeira das universidades, os debatedores também teceram críticas ao conteúdo da Medida Provisória (MP 785/2017) – que modifica o Fundo de Financiamento Estudantil (FIES) criando três modalidades distintas. Mas a maior preocupação dos debatedores é a apresentação de uma emenda que permitiria, em caso de aprovação, o fechamento da Unila e a disponibilização da infraestrutura existente para a criação da Universidade Federal do Oeste do Paraná.
O reitor da Unila criticou a possibilidade e sugeriu ao senador Paulo Paim (PT-RS) a articulação para a criação de uma frente parlamentar em defesa, não só da educação pública, como das onze universidades federais em processo de implantação e das universidades que, como a Unila, possuem “vocação internacional e realizam trabalho na área de direitos humanos em seu cotidiano”.
Paim prometeu iniciar o diálogo com os colegas parlamentares para iniciar a elaboração e a construção da frente. O senador ainda anunciou que fará na próxima sessão deliberativa da CDH, agendada para amanhã, uma tentativa de votar uma moção de apoio as duas universidades (Unila e Unilab) e de moção de repúdio a emenda apresentada a MP 785 que pode acarretar no fechamento da UNILA.
Na avaliação da senadora Regina Sousa (PT-PI), presidenta da CDH, o difícil momento enfrentado pela educação no País não surpreende, já que a oposição avisava sobre a falta de recursos para o setor em decorrência da aprovação da alteração constitucional conhecida como “teto de gastos”.
“A Emenda 95 já dava esse recado. A gente dizia que iam retirar recursos da saúde e da educação e eles [governistas] negavam. Já disse e repito. A pauta ligada aos direitos humanos não é importante para esse governo e nem para seus apoiadores. Precisamos juntar nossas pautas. Se não unificarmos nossas lutas vai ficar cada vez mais difícil para nós”, advertiu.
Já a senadora Fátima Bezerra (PT-RN) disse que as dificuldades vividas pela educação são fruto da continuidade do “golpe parlamentar” iniciado com a saída da presidenta Dilma Rousseff.
“A educação historicamente tem sido uma das áreas mais afetadas em momentos de ruptura democrática. A situação de penúria que passam as universidades e os institutos federais falam por si. Chegamos ao ponto de não ter orçamento nem para termos previsibilidade para pagamentos de contas como água e luz”, destacou.
Os representantes do governo na audiência pública, Mauro Rabelo, diretor de Desenvolvimento da Rede de Instituições Federais de Ensino Superior do Ministério da Educação e Geraldo Andrade de Oliveira, diretor de Articulação e Expansão de Educação Profissional e Tecnológica do Ministério da Educação limitaram-se a explicar questões técnicas orçamentárias e transmitir os questionamentos ao ministro da Educação, Mendonça Filho.
“Como representantes do MEC capturamos diversas mensagens. Temos trabalhado para garantia das condições de funcionamento das universidades. Até o momento liberamos 65% do orçamento destinado ao custeio das universidades. Isso significa 8/12 do orçamento total. Por enquanto, a situação está sob controle”, disse Mauro.
A senadora Fátima Bezerra anunciou a intenção de solicitar audiência pública com a presença do ministro da Educação, Mendonça Filho, para que ele detalhe a dotação orçamentária para o restante do ano na área da educação e a real situação do investimento público nas universidades federais.
Voto de pesar
Durante a audiência, o senador Paulo Paim prestou homenagem a Carlos Araújo, que faleceu no último final de semana. O senador relatou ter entrado na política por convite feito, em Canoas, interior do Rio Grande do Sul, por Carlos Araújo e a ex-presidenta Dilma Rousseff.
“Eles foram lá me convidar para que eu entrasse na vida pública. Nunca me esqueço. Depois, ele se afastou da política e passou a se dedicar integralmente a advocacia, defendendo os mais pobres, o povo. Sempre na área trabalhista e dos direitos humanos”, lembrou Paim.