Ex-conselheiro do Carf fica ‘mudo’ em comissão

“Felizmente, temos a Lei 12.846/2013, a Lei dos Corruptores, que trouxe um instrumento legal para que o Estado não seja vítima daqueles que deveriam dar exemplo à sociedade brasileira”, disse José PimentelTrês ex-conselheiros do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf) da Receita Federal – todos investigados pela Operação Zelotes, da Polícia Federal – foram ouvidos nesta quinta-feira (18) pela Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) do Senado que investiga irregularidades no órgão cometidas por ex-conselheiros. Dois ex-membros do Carf, Paulo Roberto Cortez e Leonardo Siade Manzan, conseguiram do Supremo Tribunal Federal liminar para permanecerem calados, mas apenas o primeiro fez uso desse direito. Manzan afirmou que seu nome foi confundido pelos policiais, enquanto o terceiro convocado, Nelson Mallmann, sócio de Cortez em escritório de assessoria contábil, respondeu alguns questionamentos.

Sobre o silêncio de Paulo Roberto Cortez durante toda a oitiva, o líder do governo no Congresso, senador José Pimentel (PT-CE), lembrou que os integrantes do colegiado dispõem de outros meios para investigá-lo. “Felizmente, temos a Lei 12.846/2013, a Lei dos Corruptores, que trouxe um instrumento legal para que o Estado não seja vítima daqueles que deveriam dar exemplo à sociedade brasileira”, afirmou.

Pimentel lembrou constar no inquérito da Polícia Federal que Cortez escrevia os votos de outro ex-conselheiro do órgão, José Ricardo da Silva. “Posteriormente, [Cortez] moveu ações judiciais contra ele, com o objetivo de cobrar os honorários devidos por esses e outros serviços”, disse o senador.

Em interceptações telefônicas da Polícia Federal, Cortez afirmou a Nelson Mallmann que, no Carf, “quem não pode fazer acordo leva a pior”. Ele ainda teria dito que o órgão virou “balcão de negócios” e quem paga impostos no Brasil são só os “coitadinhos”. No diálogo, os dois mencionam casos de suborno envolvendo conselheiros do Carf e grandes empresas investigadas na Operação Zelotes.

Indagado pelo senador Pimentel, Mallmann disse que a conversa era em tom de indignação. “Pessoas que tinham mais facilidade de contratar bons escritórios sempre levariam a melhor [nos processos do Carf]”, disse ele. Sobre o órgão ter virado um “balcão de negócios”, respondeu desconhecer qualquer iniciativa neste sentido.

Confusão de nomes

Leonardo Siade Manzan, logo no início do depoimento, disse que seu nome foi confundido pelos investigadores da Zelotes. Ele resolveu falar mesmo com uma liminar do STF que lhe garantia ficar em silêncio durante a oitiva.

“Infelizmente fui incluído nessa operação por um erro lamentável de confusão de nomes. Meu nome é Leonardo Manzan e no inquérito tem vários Leonardos”, disse, acrescentando que “a própria Polícia Federal pediu minha exclusão [das investigações], dizendo inclusive que não havia fatos relevantes com relação a mim”.

A Polícia Federal chegou a apreender R$ 800 mil na casa desse ex-conselheiro, que afirmou, no entanto, que o dinheiro estava declarado à Receita. Manzan é genro de um ex-presidente do conselho, Otacílio Cartaxo, considerado pela PF como participante do esquema de venda de decisões favoráveis a grandes empresas, como o expediente de reduzir dívidas tributárias.

Pimentel indagou Manzan se ele orienta seus clientes a guardarem dinheiro em casa ao invés de aplicá-lo. Como o ex-conselheiro disse que “cada um faz o que quiser com o seu dinheiro”, o senador petista insistiu: “como advogado, contador, analista de mercado, o senhor acha mais correto deixar R$ 800 mil no cofre do que aplicar no sistema?”, questionou. Sobre o tema, Manzan não disse apenas que “era tudo o que tinha para falar”.

Zelotes

As investigações da Polícia Federal analisam denúncias de um esquema de manipulação de julgamentos no Carf, propiciando a redução de multas de sonegadores de impostos. A operação já comprovou prejuízos de R$ 6 bilhões aos cofres públicos, mas auditores avaliam que a fraude possa ultrapassar os R$ 19 bilhões.

O Carf atua como um tribunal, onde contribuintes, sejam empresas ou pessoas físicas, podem questionar cobranças da Receita antes de recorrer à Justiça comum. Metade dos conselheiros do órgão é formada por servidores de carreira da Receita e, a outra metade, indicados por representantes dos contribuintes, como a Confederação Nacional do Comércio – que indicou Cortez e Manzan para o conselho.

Carlos Mota

 

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